Você compra um pacote de
salgadinhos achando que ele virá cheio de besteiras crocantes, você pinta o
cabelo de ruivo achando que vai ficar idêntica à mocinha da novela, você
investe todo o seu potencial no seu emprego achando que finalmente vai subir de
cargo, você namora com o menino porque ele parece O príncipe.
Só que quando você compra o
salgadinho percebe que o pacote está cheio de ar, quando você pinta o cabelo
percebe que não ficou com o rosto e o corpo e a vida da mocinha da novela,
quando você se empenha no seu emprego percebe que seu chefe promoveu o seu
colega, quando você namora o príncipe acaba vendo que: "Poxa, ele não tem
um cavalo branco!"
E depois das tentativas de ser
satisfeita por algo ou por alguém, você percebe que parou de comprar os
salgadinhos porque eles não vem na quantidade suficiente para a sua fome, você
percebe que parou de pintar os cabelos de ruivo porque a tinta não lhe deixa
como você queria, percebe que você saiu do emprego porque não foi reconhecida
pelo chefe, percebe que terminou o namoro porque príncipe que se preze tem que
ter um cavalo branco.
O que todos esses fatos tem em
comum? A nossa tendência em criar expectativas, se decepcionar e culpar o outro
ou a "coisa" como incapazes de nos satisfazer. O ponto principal é a
idealização que temos a respeito da vida, como se fosse possível viver num
conto de fadas durante todo o tempo, como se a todo momento tivéssemos que encontrar
àquilo que classificamos como ideal para nós.
E aí surgem os
questionamentos: "Por que quero muito uma coisa e quando consigo, perco o
interesse?", "Por que fulano não é assim?", "Por que eu
consegui o que tanto queria e não me senti como imaginei que me sentiria?",
"Por que 'as pessoas me decepcionam' tanto?", "Por que as coisas
não são como eu quero?"
A psicanálise nos mostra que
quando desejamos alguma coisa estamos buscando algo que nos satisfazia no
passado e que perdemos, e que, a partir do momento que saciamos o nosso desejo
no presente perdemos a vontade de tê-lo e partimos em busca de outra forma de
satisfação futura, ou de outro objeto de desejo com base naquilo que perdemos
ou não temos ainda.
Complicado de entender? Bem,
vamos a parte menos complexa: É importante sabermos que o objeto de desejo
nunca é real, na verdade buscamos neles aquilo que julgamos ideal, aquilo que
esperamos que ele seja para nos satisfazer. Por isso que desvalorizamos o
objeto de desejo assim que ele se torna real, porque enquanto real ele não
consegue mais satisfazer as nossas idealizações e fantasias, enquanto real ele
possui falhas e não tem o dever de corresponder às nossas expectativas. Esse
segundo Freud, é o conflito básico entre o real e o ideal.
Essa reflexão abre um outro
questionamento: Por que muitas pessoas preferem viver as paixões do que entrar
em contato com o amor? A resposta é: Porque enquanto apaixonado o indivíduo
vive em um mundo ideal, enxerga no outro tudo aquilo que deseja para si. Porém
quando é frustrado pelo outro a pessoa apaixonada acaba perdendo o interesse:
"ele não serve para mim", e acaba desistindo da relação.
É por isso que rotineiramente
desistimos daquilo que tanto queríamos, porque quando nos aproximamos do nosso
objeto de desejo percebemos a sua verdadeira forma e julgamos que ele não
poderá satisfazer as nossas expectativas. Ou seja, optamos pela manutenção do
ideal e assim excluímos aquele sonho, aquele desejo, aquela pessoa de nossos
planos porque achamos que eles não possuem a capacidade de nos satisfazer. Mas,
cabe ressaltar que quando não desistimos do nosso objeto de desejo, é muito
comum nessas situações que "obriguemos" aquele objeto a ser conforme
idealizamos, como gostaríamos que fosse. Assim podemos entender os papéis
desempenhados pelos parceiros nos relacionamentos, algo do tipo: "Eu mando
e você obedece", "Eu faço tudo o que você quiser"...
Bem, dessa forma fica mais fácil
compreender que a causa das nossas frustrações corresponde às expectativas -
idealizações que temos sobre as nossas paixões.
Contudo,
para que esses aspectos de idealização, frustração, expectativa e realidade,
sejam elaborados, é necessário identificar de onde eles vem, qual a qualidade
dos afetos, e de que modo eles estão interferindo nas relações interpessoais e
na vida em geral, dentre outros fatores.É importante lembrar sempre que os
indivíduos não correspondem à uma conta matemática simples, cada um possui sua
singularidade, sua história de vida e condições para que se estruture de tal
forma. Para isso é fundamental procurar auxílio psicológico para que o
psicólogo avalie e proponha um projeto terapêutico singular, específico e
adequado para cada indivíduo.
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