quinta-feira, 2 de junho de 2016

Príncipe ou Sapo? Real x Ideal

Você compra um pacote de salgadinhos achando que ele virá cheio de besteiras crocantes, você pinta o cabelo de ruivo achando que vai ficar idêntica à mocinha da novela, você investe todo o seu potencial no seu emprego achando que finalmente vai subir de cargo, você namora com o menino porque ele parece O príncipe.

Só que quando você compra o salgadinho percebe que o pacote está cheio de ar, quando você pinta o cabelo percebe que não ficou com o rosto e o corpo e a vida da mocinha da novela, quando você se empenha no seu emprego percebe que seu chefe promoveu o seu colega, quando você namora o príncipe acaba vendo que: "Poxa, ele não tem um cavalo branco!"

E depois das tentativas de ser satisfeita por algo ou por alguém, você percebe que parou de comprar os salgadinhos porque eles não vem na quantidade suficiente para a sua fome, você percebe que parou de pintar os cabelos de ruivo porque a tinta não lhe deixa como você queria, percebe que você saiu do emprego porque não foi reconhecida pelo chefe, percebe que terminou o namoro porque príncipe que se preze tem que ter um cavalo branco.

O que todos esses fatos tem em comum? A nossa tendência em criar expectativas, se decepcionar e culpar o outro ou a "coisa" como incapazes de nos satisfazer. O ponto principal é a idealização que temos a respeito da vida, como se fosse possível viver num conto de fadas durante todo o tempo, como se a todo momento tivéssemos que encontrar àquilo que classificamos como ideal para nós. 
 E aí surgem os questionamentos: "Por que quero muito uma coisa e quando consigo, perco o interesse?", "Por que fulano não é assim?", "Por que eu consegui o que tanto queria e não me senti como imaginei que me sentiria?", "Por que 'as pessoas me decepcionam' tanto?", "Por que as coisas não são como eu quero?"


A psicanálise nos mostra que quando desejamos alguma coisa estamos buscando algo que nos satisfazia no passado e que perdemos, e que, a partir do momento que saciamos o nosso desejo no presente perdemos a vontade de tê-lo e partimos em busca de outra forma de satisfação futura, ou de outro objeto de desejo com base naquilo que perdemos ou não temos ainda.

Complicado de entender? Bem, vamos a parte menos complexa: É importante sabermos que o objeto de desejo nunca é real, na verdade buscamos neles aquilo que julgamos ideal, aquilo que esperamos que ele seja para nos satisfazer. Por isso que desvalorizamos o objeto de desejo assim que ele se torna real, porque enquanto real ele não consegue mais satisfazer as nossas idealizações e fantasias, enquanto real ele possui falhas e não tem o dever de corresponder às nossas expectativas. Esse segundo Freud, é o conflito básico entre o real e o ideal.

Essa reflexão abre um outro questionamento: Por que muitas pessoas preferem viver as paixões do que entrar em contato com o amor? A resposta é: Porque enquanto apaixonado o indivíduo vive em um mundo ideal, enxerga no outro tudo aquilo que deseja para si. Porém quando é frustrado pelo outro a pessoa apaixonada acaba perdendo o interesse: "ele não serve para mim", e acaba desistindo da relação.
É por isso que rotineiramente desistimos daquilo que tanto queríamos, porque quando nos aproximamos do nosso objeto de desejo percebemos a sua verdadeira forma e julgamos que ele não poderá satisfazer as nossas expectativas. Ou seja, optamos pela manutenção do ideal e assim excluímos aquele sonho, aquele desejo, aquela pessoa de nossos planos porque achamos que eles não possuem a capacidade de nos satisfazer. Mas, cabe ressaltar que quando não desistimos do nosso objeto de desejo, é muito comum nessas situações que "obriguemos" aquele objeto a ser conforme idealizamos, como gostaríamos que fosse. Assim podemos entender os papéis desempenhados pelos parceiros nos relacionamentos, algo do tipo: "Eu mando e você obedece", "Eu faço tudo o que você quiser"...
Bem, dessa forma fica mais fácil compreender que a causa das nossas frustrações corresponde às expectativas - idealizações que temos sobre as nossas paixões.



Contudo, para que esses aspectos de idealização, frustração, expectativa e realidade, sejam elaborados, é necessário identificar de onde eles vem, qual a qualidade dos afetos, e de que modo eles estão interferindo nas relações interpessoais e na vida em geral, dentre outros fatores.É importante lembrar sempre que os indivíduos não correspondem à uma conta matemática simples, cada um possui sua singularidade, sua história de vida e condições para que se estruture de tal forma. Para isso é fundamental procurar auxílio psicológico para que o psicólogo avalie e proponha um projeto terapêutico singular, específico e adequado para cada indivíduo.



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